Cotasraciais, com certeza, é um tema bastante polêmico. Muitas pessoas são a favor e muitas são contra.
Esse texto não tem o objetivo de debater a finalidade das cotas raciais.
Meu objetivo é explicá-las à luz da legislação vigente, mas principalmente ajudar os candidatos cotistas que foram eliminados em concursos públicos por não ter sido considerado negro ou pardo (isso acontece principalmente com pessoas de cor parda).
Cotas raciais são reservas de vagas em concursos públicos destinadas a pessoas de cor negra e de cor parda.
As cotas para pessoas negras e pessoas pardas em concursos públicos foram criadas pela Lei nº 12.990/2014 e tem aplicabilidade somente no âmbito da administração pública federal, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pela União.
Embora a Lei nº 12.990/2014 trate exclusivamente dos concursos públicos federais, praticamente todos os Estados e Municípios seguem essa mesma lei nos seus concursos, salvo nos casos de existência de lei própria.
QUAL O OBJETIVO DAS COTAS RACIAIS?
O objetivo das cotas raciais é diminuir a desigualdade racial, que ainda exclui muitas pessoas negras do mercado de trabalho no Brasil.
Os diversos sites de notícias divergem muito a respeito do percentual de vagas ocupadas por negros atualmente no serviço público federal.
Cerca de quatro a cada 10 (42%) pessoas que entram no funcionalismo público do Executivo federal civil são negros, diz levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Dados do governo mostram que, embora sejam aproximadamente 55% da população, negros ocupam 35,6% dos postos no serviço público federal.
A disparidade fica ainda mais visível quando é feito o recorte por hierarquia de cargos e nível de escolaridade. Pretos e pardos ocupam apenas 15% das cadeiras mais altas.
Apesar dessas divergências, dá pra notar que ainda existe muita diferença entre brancos e negros no serviço público federal, apesar de a população negra no Brasil ser maior do que a população branca.
O que nos leva à conclusão de que o serviço público federal no Brasil ainda precisa melhorar nesse aspecto da igualdade racial.
Muita gente tem dúvidas de como funcionam as cotas raciais.
Como dito acima, a lei de cotas raciais reserva aos negros e pardos um percentual das vagas oferecidas nos concursos públicos.
No âmbito dos concursos públicos federais (administração pública direta e indireta), a União concede 20% (vinte por cento) das vagas.
Embora exista uma prática comum de seguir as leis federais, Estados e Municípios não precisam seguir essa mesma regra, já que possuem autonomia legislativa para regulamentar a matéria.
Ou seja, se não existir lei naquele Ente Federado prevendo a reserva de vagas aos negros e pardos, os Editais dos concursos também não irão prever reserva de vagas para negros em seus concursos públicos.
Em Belo Horizonte, por exemplo, a Lei nº 10.924/2016 reserva aos negros 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos públicos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública direta e indireta do Poder Executivo do Município.
Já a nível estadual, Minas Gerais não possui lei que trata de reserva de vagas para candidatos negros. Mas um Projeto de Lei (PL 690/2015) tramita na ALMG desde 2015, visando estabelecer cotas raciais para o ingresso de negros e negras no serviço público estadual em cargos efetivos da administração pública direta e indireta.
RESUMO: Dos 26 Estados e DF (27 entes federados), apenas 15 possuem cotas raciais em concursos públicos, ou seja 55% dos Entes Federados apenas
Se você é negro ou pardo e mora em algum desses Estados que ainda não possuem cotas raciais, mobilize-se nessa luta e cobre seus Deputados Estaduais para que aprovem o mais rápido possível os projetos de leis que eu mencionei em cada um dos estados (clique nos links).
LEI DE COTAS RACIAIS NOS CONCURSOS PÚBLICOS – LEI Nº 12.990, DE 9 DE JUNHO DE 2014
Conforme dito anteriormente, a Lei nº 12.990, de 9 de junho de 2014 é uma lei Federal, que vincula somente os editais de concursos públicos federais.
Vejamos abaixo os principais pontos da regulamentação das cotas raciais:
Reserva de 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas nos concursos públicos federais (dos três poderes, tanto administração pública direta e indireta) aos negros e pardos;
A reserva é aplicada sempre que o número de vagas oferecidas no concurso público for igual ou superior a 3 (três);
Na hipótese de quantitativo fracionado: aumentado para o primeiro número inteiro subsequente, fração igual ou maior que 0,5 (cinco décimos), ou diminuído para número inteiro imediatamente inferior, em caso de fração menor que 0,5 (cinco décimos);
A reserva de vagas a candidatos negros deverá constar expressamente nos editais dos concursos públicos;
Podem concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos, conforme critérios definidos pelo IBGE;
Se for constatado declaração falsa, o candidato será eliminado do concurso;
Candidatos negros podem concorrer concomitantemente às vagas destinadas à ampla concorrência;
A nomeação dos candidatos aprovados respeitará os critérios de alternância e proporcionalidade;
Percebam que essa Lei não é muito grande, e não traz muitos detalhes. Ficando a cargo dos órgãos públicos a regulamentação desta lei.
O grande problema dessas regulamentações, é que podem surgir diversas ilegalidades emanadas dos órgãos competentes.
É aí que os candidatos negros e pardos precisam ficar atentos.
COMO FUNCIONA O SISTEMA DE COTAS EM CONCURSOS PÚBLICOS?
Assim como está nos principais tópicos da lei que eu citei acima, só haverá reserva para negros e pardos quando o número de vagas oferecidas no concurso público for igual ou superior a 3 (três).
Contudo, caso haja convocação de mais candidatos aprovados durante a validade do concurso, deve o órgão público nomear os candidatos aprovados dentro das vagas reservadas aos negros e pardos.
Outra norma importante é que todos os editais de concursos públicos federais devem constar expressamente a reserva de vagas para candidatos negros.
Alguns órgãos públicos já tiveram problema com isso, por não constar tal reserva. Polícia Federal, Instituto Rio Branco, Forças Armadas e Institutos Federais de Educação e INSS já tiveram problema com a Justiça por não reservar em seus editais as cotas raciais.
De acordo com a JC Concursos, Ministério Público e Defensoria pública ajuizaram ações contra esses órgãos para que se garantissem em seus concursos as cotas para negros e pardos, conforme prevê a Lei nº. 12.990/2014.
Na defesa de um desses órgãos, chegou-se a afirmar que: “A lei só poderia ser aplicada se e quando o IBGE instituir critérios objetivos para definição de cor e de raça, já que, pela autodeclaração, todos podem ser cotistas, o que inviabiliza o sistema de cotas”.
É claro que esse argumento era ridículo e nem foi acatado pela Justiça.
Atualmente, os órgãos públicos federais, após quase 10 anos de vigência da lei, sempre prevêem as cotas raciais nos editais.
QUANTAS VAGAS SÃO RESERVADAS PARA PESSOAS NEGRAS EM CONCURSOS PÚBLICOS?
Voltamos às regras principais no que concerne aos percentuais de vagas reservadas para pessoas negras e pardas em concursos públicos:
Reserva de 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas nos concursos públicos federais (dos três poderes, tanto administração pública direta e indireta) aos negros e pardos;
A reserva é aplicada sempre que o número de vagas oferecidas no concurso público for igual ou superior a 3 (três);
Na hipótese de quantitativo fracionado: aumentado para o primeiro número inteiro subsequente, fração igual ou maior que 0,5 (cinco décimos), ou diminuído para número inteiro imediatamente inferior, em caso de fração menor que 0,5 (cinco décimos);
Na prática, funciona da seguinte forma:
Se o concurso tem uma ou duas vagas somente, nenhuma dessas vagas é de cotas raciais.
Contudo, na vigência do certame, caso haja mais nomeações, a 3ª é reservada ao primeiro colocado na lista das cotas raciais.
Caso o edital preveja 3 ou mais vagas de imediato, a 3ª vaga já está garantida para o primeiro colocado na lista das cotas raciais.
A fim de facilitar o entendimento, vou colocar aqui abaixo um quadro bastante auto explicativo, de forma que você entenda de uma vez por todas quais são exatamente as vagas para candidatos negros e pardos em concursos que também possuem vagas reservadas às pessoas com deficiência.
Faça o download do PDF completo do PDF contendo essa imagem acima neste link.
CÁLCULO DO PERCENTUAL DE VAGAS RESERVADAS PARA PESSOAS NEGRAS E PARDAS EM CONCURSOS
Se você ainda não entendeu a explicação acima, resolvi te trazer outra planilha, com os cálculos realizados, vaga por vaga, para que você entenda o real motivo de cada uma das vagas acima serem destinadas às pessoas negras e pardas em concursos.
Veja:
Com a planilha acima, fica mais fácil de entender a questão do quantitativo fracionado, que vai aumentado para o primeiro número inteiro subsequente quando o resultado for fração igual ou maior que 0,5 (cinco décimos), ou diminuindo para número inteiro imediatamente inferior, em caso de fração menor que 0,5 (cinco décimos).
AUTODECLARAÇÃO: COMO FAÇO PARA DECLARAR MINHA COR/RAÇA?
A autodeclaração de que você é negro ou pardo para fins de concorrer às vagas reservadas é muito simples e é feita no ato da inscrição do concurso público, bastando que você preencha o formulário no site da banca de maneira correta.
Vale lembrar que, após o período das inscrições, caso você não tenha selecionado a opção de participar do concurso como candidato negro ou pardo, você não poderá mais alterar isso durante a validade do certame viu?
Depois não adianta chorar hehehe.
Já vi inúmeros candidatos que não fizeram a opção pelas cotas raciais durante as inscrições e, depois do resultado das provas, ao perceber que sua nota não estava dentro da nota de corte da ampla concorrência, mas estaria dentro das cotas raciais, nos procuraram para ingressar com ação judicial para alterar essa condição.
Isso não é possível viu! A justiça tem o entendimento de que se fosse possível alterar a inscrição, após a realização das provas, violaria o princípio da isonomia, prejudicando injustamente outros candidatos.
O QUE É PRETO OU PARDO PARA FINS DE COTA EM CONCURSOS?
Segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), dentre todas as opções para se avaliar se a pessoa tem direito às cotas raciais, a que parece menos defensável é o exame do genótipo (características genéticas, hereditárias).
A Corte entende que o preconceito no Brasil parece resultar, essencialmente, da percepção social, muito mais do que da origem genética.
Em outras palavras, no Brasil se utiliza o critério fenotípico para avaliar se uma pessoa é ou não é negra ou parda.
E quem mais sofre em concursos públicos com as ilegalidades cometidas pelas bancas de concursos, especialmente no exame de heteroidentificação, são as pessoas pardas, que se encontram na chamada “zona cinzenta”.
Veja o que o STF entende a respeito:
Para dar concretude a esse dispositivo, entendo que é legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação para fins de concorrência pelas vagas reservadas, para combater condutas fraudulentas e garantir que os objetivos da política de cotas raciais sejam efetivamente alcançados.
[…]
A grande dificuldade, porém, é a instituição de um método de definição dos beneficiários da política e de identificação dos casos de declaração falsa, especialmente levando em consideração o elevado grau de miscigenação da população brasileira.
[…]
Porém, quando houver dúvida razoável sobre o fenótipo, deve prevalecer o critério da autodeclaração da identidade racial.
Isso significa que, havendo dúvidas sobre as características fenotípicas de um candidato pardo, por exemplo, deve prevalecer a autodeclaração prestada por ele.
Como saber se sou pardo?
Existe sim uma forma científica de se provar que você é pardo.
Através da sua aparência, é possível provar que você possui características fenotípicas de pessoas negras.
Essas são as principais características fenotípicas de pessoas negras:
boca um pouco mais larga
formato do cabelo em seu estado natural (sendo crespo ou cacheado, por exemplo)
formato dos olhos
base do nariz alargada
cor da pele (seguindo a escala de Fitzpatrick)
aspectos do crânio
Recomendo fortemente procurar um dermatologista para que ele faça em você um teste chamado Fitzpatrick (falarei mais sobre ele adiante).
O que é a Escala de Fitzpatrick?
Esse teste é uma classificação da cor da pele, que vai do nível 1 até o 6, sendo que o nível 1 a cor mais branca da escala e o nível 6 a cor mais negra da escala
Apartir do grau 4 dessa escala já é considerado uma pele morena e as chances de não ser considerado como negro aqui diminui, embora já atuamos em processos judiciais em que pessoas com a pele de nível 4 dessa escala teve que brigar na justiça para ter reconhecido seu direito à concorrer às vagas reservadas para negros.
De todo modo, caso você tenha sido “reprovado” na comissão de heteroidentificação, levando o seu caso para a Justiça, existem alguns mecanismos para provar sua condição de pessoa negra.
A mais importante e que nós utilizamos bastante é requerer ao juiz a realização de uma perícia judicial, onde um médico irá afirmar se você é negro ou não.
E para facilitar ainda mais o trabalho desse perito, nós pedimos aos nossos clientes que providenciem esse laudo médico, através de um médico particular.
Nem sempre os médicos particulares fornecem esse laudo, mas se pelo menos ele fizer o Teste de Fitzpatrick, já é um ótimo indício de prova.
Com isso, nós conseguimos juntar esse laudo médico, logo no início do processo judicial.
Isso ajudará demais a convencer o perito de que você, de fato, possui sim as características fenotípicas de uma pessoa negra.
E além disso, com esse laudo, as chances de conseguir uma liminar para o seu caso aumenta consideravelmente, uma vez que já demonstraremos para o juiz que a probabilidade de você realmente ser negro é muito grande.
O QUE É A COMISSÃO DE HETEROIDENTIFICAÇÃO?
As comissões de Heteroidentificação surgiram porque a lei diz que, na hipótese de constatação de uma declaração falsa, o candidato deve ser eliminado do concurso.
As comissões de verificação ou bancas examinadoras avaliam o fenótipo (aparência física) do candidato.
Infelizmente, características genéticas não são consideradas como provas de que você é negro.
São raríssimos os editais de concurso que preveem essa possibilidade.
A título de exemplo, o concurso da Polícia Civil de SP, Edital Escrivão de Polícia – EP1/2022 previu essa possibilidade:
Mas isso não é comum viu.
Não existe uma padronização, mas geralmente essas bancas são compostas por 3 a mais pessoas, nomeadas pela banca organizadora ou pelo próprio orgão público e a função dela.
QUAL O OBJETIVO DO EXAME DE HETEROIDENTIFICAÇÃO?
O único objetivo do exame de heteroidentificação é de controlar possíveis fraudes de candidatos que concorrem nas cotas raciais.
Isso porque muitas pessoas brancas, que apesar de se autodeclararem negras ou pardas, não possuem características fenotípicas (aparência física) de uma pessoa negra.
Dessa forma, muitos negros e pardos se sentiam injustiçados e começaram a denunciar tais atitudes, levando o Poder Judiciário a interferir nessas questões.
Porém, segundo o próprio STF, esse controle de fraudes deve sempre ser implementado de modo a respeitar a dignidade da pessoa humana dos candidatos.
Além disso, devem ser garantidos os direitos ao contraditório e à ampla defesa, caso a comissão de heteroidentificação entenda pela exclusão do candidato nas vagas reservadas aos negros e pardos.
COMO FUNCIONA O EXAME DE HETEROIDENTIFICAÇÃO?
De forma bem resumida, o Exame de Heteroidentificação funciona da seguinte forma:
o candidato é convocado para a realização do exame de heteroidentificação (que pode ser presencial ou à distância, por meio de chamada de vídeo)
a comissão de heteroidentificação fará uma análise das características fenotípicas do candidato autodeclarado preto ou pardo
a comissão de heteroidentificação verificará se o candidato atende aos critérios fenotípicos que o identifiquem como preto ou pardo, confirmando, ou não, a autodeclaração prestada.
PORQUE TANTA GENTE TÊM SIDO ELIMINADA POR CAUSA DO EXAME DE HETEROIDENTIFICAÇÃO?
Infelizmente, muitas ilegalidades vêm sendo cometidas pelas Comissões de Heteroidentificação.
Situações absurdas tem ocorrido, como:
aprovar um candidato e reprovar seu gêmeo univitelino;
excluir candidato porque foi considerado “’pardo claro” (um absurdo, pois não há nenhum regulamento nesse sentido);
candidato considerado negro em um concurso e excluído em outro, sendo que passou pela mesma banca organizadora;
entre outras situações
Mas o grande problema mesmo é que essas comissões de heteroidentificação não têm utilizado de conhecimentos científicos para definir quem é negro ou não.
Inclusive, não são raras as vezes em que essas comissões são influenciadas por ideologias políticas que acabam prejudicando principalmente as pessoas pardas.
CANDIDATO EXCLUÍDO DAS COTAS RACIAIS PODE PARTICIPAR DA AMPLA CONCORRÊNCIA?
Aqui está uma questão bastante polêmica.
Pois muitas bancas de concurso acabam eliminando os candidatos autodeclarados negros que são excluídos das cotas.
As bancas alegam que uma vez que o candidato não é negro, eles consideram que ele “fraudou” a autodeclaração, devendo ser eliminados do certame.
Da mesma forma, a Portaria MPOG 4/2018, considera que devem ser eliminados esses candidatos. Veja:
Art. 11. Serão eliminados do concurso público os candidatos cujas autodeclarações não forem confirmadas em procedimento de heteroidentificação, ainda que tenham obtido nota suficiente para aprovação na ampla concorrência e independentemente de alegação de boa-fé.
Art. 8 – § 5º O candidato que não comparecer ao procedimento de heteroidentificação será eliminado do concurso público, dispensada a convocação suplementar de candidatos não habilitados.
Essas duas previsões acima são totalmente ilegais, assim já decidiu o Poder Judiciário.
Segundo a esmagadora maioria das decisões judiciais, os candidatos cujas autodeclarações não forem confirmadas em procedimento de heteroidentificação PODEM E DEVEM continuar no certame, na lista da ampla concorrência.
Veja essa decisão:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. SISTEMA DE COTAS. HETEROIDENTIFICAÇÃO. INAPTIDÃO. ELIMINAÇÃO DO CERTAME. ILEGALIDADE. PERMANÊNCIA NA LISTA DE AMPLA CONCORRÊNCIA. POSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL DESPROVIDAS. 1. Cuida-se de apelação e remessa oficial em face de sentença que concedeu a segurança para manter o impetrante na lista de ampla concorrência, no concurso público para o cargo de Professor do Instituto de Engenharia/ Engenharia de Controle e Automação da Universidade Federal de Mato Grosso, campus de Várzea Grande – EDITAL N.º 06/SGP/UFMT/2018. 2. O Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, decidiu ser legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios de heteroidentificação. Porém, frisou a necessidade de observância aos princípios da dignidade da pessoa humana, do contraditório e da ampla defesa (STF. Plenário. ADC 41/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 8/6/2017). 3. No caso dos autos, o candidato foi o único aprovado no concurso para o cargo concorrido, tanto nas vagas reservadas à ampla concorrência como nas vagas de cotistas. Contudo, durante o procedimento de heteroidentificação, foi desclassificado do concurso. 4. Não houve declaração falsa por parte do impetrante, mas apenas discordância entre a percepção de como o candidato se identifica e a conclusão da comissão do concurso durante o procedimento de heteroidentificação. Isso porque o candidato juntou aos autos documentos públicos em que se identifica como de cor parda, bem como laudo dermatológico em que é identificado da mesma forma. A autodeclaração reflete a percepção do próprio candidato sobre a sua condição, não podendo ser sancionada em caso de não confirmação, salvo quando comprovada a má-fé. 5. Assim, sendo ilegal a eliminação do candidato, impõe-se retorná-lo ao concurso na condição de aprovado na lista de ampla concorrência. Precedentes desta Turma. 6. Apelação e remessa oficial desprovidas.
(TRF-1 – AC: 10110070720194013600, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO, Data de Julgamento: 13/10/2021, QUINTA TURMA, Data de Publicação: PJe 13/10/2021 PAG PJe 13/10/2021 PAG)
NÃO COMPARECI NO DIA DO EXAME DE HETEROIDENTIFICAÇÃO, POSSO SER ELIMINADO?
Um ponto bastante interessante e que você não pode deixar que aconteça com você é de ser eliminado do certame por não ter sido considerado negro ou por não ter comparecido ao exame de heteroidentificação.
Caso você não tenha comparecido no dia do exame, a banca é obrigada a manter seu nome na lista da ampla concorrência, pelo menos.
A única coisa que você perde, é o direito de concorrer nas cotas raciais, só isso.
Veja essa decisão:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. SISTEMA DE COTAS. HETEROIDENTIFICAÇÃO. COMISSÃO AVALIADORA. NÃO COMPARECIMENTO PERANTE A BANCA EXAMINADORA. ELIMINAÇÃO DO CERTAME. ILEGALIDADE. PERMANÊNCIA NA LISTA DE AMPLA CONCORRÊNCIA. POSSIBILIDADE. SENTENÇA REFORMADA. I No julgamento da Ação Direta de Constitucionalidade nº 41, de relatoria do Ministro Roberto Barroso, o Supremo Tribunal Federal adotou a tese de que É constitucional a reserva de 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública direta e indireta. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação, desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa. II No caso concreto, a candidata deixou de compareceu ao procedimento previsto no subitem 6.2.1 do edital, o que não se confunde com a constatação de declaração falsa, prevista como critério de eliminação do concurso na Lei 12.990/2014, de modo que não se mostra razoável nem legítimo impedir que concorra a uma vaga por meio do sistema universal, ampla concorrência. III A submissão à comissão para verificação da veracidade de autodeclaração apresentada pelo candidato é condição para que seja concorra às vagas reservadas a candidatos negros e pardos e não deve interferir na situação daqueles que se figuraram aprovados e classificados nas vagas destinadas a ampla concorrência e optem por permanecer apenas nestas. IV A jurisprudência deste Tribunal firmou entendimento segundo o qual é indevida a eliminação de candidato que, embora tenha se autodeclarado preto ou pardo para concorrer às vagas reservadas em concurso público, foi desclassificado por comissão avaliadora, desde que obtenha desempenho suficiente para figurar na lista geral de aprovados. ( AC 0073757-85.2016.4.01.3400, JUÍZA FEDERAL MARA ELISA ANDRADE (CONV.), TRF1 – QUINTA TURMA, e-DJF1 19/12/2018 PAG.) V Recurso de apelação a que se dá parcial provimento.
(TRF-1 – AMS: 10001059620184013804, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA, Data de Julgamento: 29/03/2021, SEXTA TURMA, Data de Publicação: PJe 05/04/2021 PAG PJe 05/04/2021 PAG)
Portanto, a Justiça é favorável aos candidatos autodeclarados negros ou pardos cujas autodeclarações não forem confirmadas em procedimento de heteroidentificaçãoou que não compareceram ao procedimento de heteroidentificação, no sentido de que estes candidatos devem figurar na lista da ampla concorrência, e não serem eliminados.
FOI ELIMINADO DO CONCURSO POR NÃO SER CONSIDERADO NEGRO?
Caso tenha ocorrido alguma das situações abaixo, você tem direito de recorrer da decisão da banca do concurso, seja na via administrativa, seja na via judicial.
Essas são as situações que dão direito de recurso:
Não ter sido considerado pessoa negra pela comissão de heteroidentificação e ter seu nome somente na lista da ampla concorrência
Não ter sido considerado pessoa negra pela comissão de heteroidentificação e ser excluído completamente do certame
Ser excluído do certame por não ter comparecido no dia do exame de heteroidentificação
Em todas essas situações, você pode recorrer das seguintes formas:
Recurso Administrativo
Ação judicial
Jamais opte pelo Mandado de Segurança, viu!
Vou explicar melhor sobre isso daqui a pouco.
COMO FAZER RECURSO PARA COTAS?
Geralmente o prazo de recurso administrativo é beeeeeeem curto, viu!
Na esmagadora maioria dos concursos, uma vez que é publicado o resultado do exame de heteroidentificação, o candidato tem 48 horas para apresentar recurso.
Você tem duas opções aqui:
Ou você mesmo elabora o recurso
Ou entrega para um Advogado Especialista em Concursos Públicos para fazer por você
É óbvio que eu sou suspeito pra falar disso.
Mas analisa a seguinte situação:
Ligação emocional
Ainda que você seja graduado em Direito, você concorda que você está emocionalmente ligado a esse caso?
Você concorda que quando estamos intimamente ligados emocionalmente com determinado assunto, nós tendemos a ser menos racionais?
E exatamente por isso que nós, advogados, quando temos uma demanda jurídica pessoal, entregamos para um colega trabalhar para nós.
Isso porque nós temos consciência de que não faremos um trabalho tão bom quando estamos trabalhando em casos que não são nossos, pois não estamos ligados emocionalmente aos casos.
Só por esse motivo acredito que você tenha entendido a importância de contar com um advogado para fazer seu recurso, concorda?
A experiência em casos anteriores faz muita diferença
Nós, da Peterson e Escobar Advogados, já atuamos em centenas de casos iguais ao seu, e em muitos deles conseguimos reverter a situação desfavorável aos nossos clientes ainda na via administrativa.
Quer um exemplo disso?
Veja o depoimento de um dos nossos clientes que teve seu recurso administrativo elaborado por nós deferido pela Comissão de Heteroidentificação:
Sexxtooouuu bb!
hehehehe
É tão bom conquistar o Direito dos clientes!
Essa foi a mensagem que ele nos enviou pelo Whatsapp assim que ele consultou o resultado.
Esse cliente gravou um vídeo contando sua experiência conosco. Assista-o:
COMO ENTRAR COM AÇÃO JUDICIAL PARA COTAS?
Em caso de ter seu recurso indeferido, ou caso não tenha entrado com recurso administrativo, você pode ingressar com ação judicial, pleiteando seu direito de permanecer nas vagas reservadas aos negros e pardos.
Mas atenção!
Jamais optem pelo mandado de segurança (como muitos advogados fazem por aí…)
Agora, eu vou te mostrar como a maioria dos advogados atuam de forma errada em ações envolvendo concursos públicos.
Diferença entre Mandado de Segurança e ação ordinária
Existe uma grande diferença entre mandado de segurança e uma ação ordinária.
E se o advogado que cuidar do seu processo não for esperto o suficiente, ele poderá perder a única chance de devolver para você o sonho do cargo público.
É muito comum advogados que não são especialistas em concursos públicos quererem sempre entrar com mandado de segurança quando são procurados para entrarem com ação de concurso público.
Mas o problema do mandado de segurança é que não admite a fase da dilação probatória, pois o direito invocado deve ser provado de plano, já no início do processo.
E adivinhem: na maioria dos casos, acabam perdendo essas ações por culpa exclusiva da estratégia errada que adotou, prejudicando assim seus clientes.
Dá uma olhada nesse trecho de uma decisão judicial, para você entender do que eu estou falando:
AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE SEGURANÇA. DILAÇÃOPROBATÓRIA. O mandado de segurança, por ser ação de cognição sumária, não admite dilaçãoprobatória, exigindo a comprovação, de plano, da violação a direito líquido e certo invocado pela parte.
Processos envolvendo Exame de Heteroidentificação precisam de perícia
Existem inúmeros processos envolvendo concursos públicos que demandam provas mais robustas para que o candidato consiga convencer o juiz do seu direito.
Esse é o caso de processos envolvendo Exame de Heteroidentificação, que necessitam de perícia.
Na perícia, serão avaliadas se as características fenotípicas do candidato são de uma pessoa negra. Somente dessa forma é que o juiz terá condições de julgar favorável o seu pedido.
Portanto, escolher o mandado de segurança nesse caso é a pior opção.
Então você deve ter muito cuidado ao contratar um advogado.
Conte com o Peterson e Escobar Advogados!
CONCLUSÃO
A intenção desse artigo é ser um Guia Completo sobre Cotas Raciais em Concursos Públicos.
Muito provavelmente eu irei adicionar mais conteúdos ao longo do tempo, conforme novidades forem surgindo sobre o tema ou até mesmo conforme a evolução da Jurisprudência.
Eu espero ter sanado suas principais dúvidas a respeito desse tema.
Mas o que eu mais quero com esse post é ajudar aqueles candidatos que foram eliminados do concurso por não ter sido considerado negro (ou pardo) ou por terem faltado ao exame de heteroidentificação.
Pois como se não bastasse todo o preconceito que a comunidade negra já sofre, ainda tem que passar pelo constrangimento de ter sua aparência física avaliada por uma comissão (que muitas vezes nem é composta por negros), em um verdadeiro tribunal racial.
E depois de tudo isso ainda ser reprovado?
Não é Justo!
E é por isso que estou com vocês nessa luta. Contem comigo!